quarta-feira

Demissão em massa e ninguém reclama

Cláudio Magnavita,

Jornalista

Oque está ocorrendo com a VarigLog é muito mais sério do que aparentemente se pode imaginar. A notícia da demissão de 900 empregados é a ponta do iceberg neste processo que leva ao desmanche a maior empresa brasileira de carga aérea.

Quando a Volo do Brasil comprou a VarigLog pagou menos de 20% do valor real da companhia. Foi o início do processo de esquartejamento dos ativos da Varig, que incluiu a Varig Engenharia e Manutenção – VEM e mais recentemente o repasse da Flex do Centro de Treinamento da Empresa.

Na venda da VarigLog fixou-se a operação financeira que adquiriu no terceiro tempo de um leilão, depois de frustrada venda para Associação de Pilotos da Varig (Apvar), que arrematou a empresa em nome de investidores-fantasma e não pôde executar o pagamento. Aliás, a Associação recebeu uma multa milionária que ainda pode ser executada pela justiça à entidade e aos seus dirigentes.

A unidade operacional da Varig foi adquirida por US$ 20 milhões e foi vendida pela Volo a Gol por R$ 530 milhões, isso mesmo, meio bilhão de reais. É exatamente esta fortuna que agora é o pivô da briga interna da VarigLog e da Volo do Brasil. Os três sócios brasileiros, necessários para que a nova sociedade exercesse os pré-requisitos legais do artigo 181 do Código Aeronáutico Brasileiro, Marcos Audi, Marcos Haftel e Eduardo Galo, entraram em litígio com o fundo Matlin Patterson exatamente porque achavam que, capitalizada com a venda da Varig, a empresa de carga deveria utilizar estes recursos para crescer e só pagar o empréstimo ao fundo em 2011, como estava contratado.

Queriam preservar empregos e crescer a frota, consolidando a VarigLog como a maior empresa de carga do país, posição que sempre ocupou ao longo da sua história. É bom lembrar que os três brasileiros realmente exerceram funções gerenciais e administrativas no comando da Varig e da VarigLog. Não eram marionetes a serviço do fundo. Na própria empresa de passageiros, a ordem dos americanos era de reduzir ou paralisar totalmente as atividades, mesmo com demissões, enquanto corretores procuravam compradores para a empresa. A Varig só se manteve no ar por conta da insistência deles, que muitas vezes eram punidos com o fechamento da torneira de financiamentos e empréstimos.

Hoje, o chinês Lap Wai Chan deve estar sorrindo. Conseguiu afastar na Justiça os sócios brasileiros, incorporando ao patrimônio 40% das ações da VarigLog sem gastar o valor real. Conseguiu, ao ser pego com a mão na cumbuca tentando transferir os US$ 86 milhões da Suíça, sair do fogo cruzado e mesmo com a imagem arranhada, manter o comando da empresa aérea através do seu braço direito Santiago Juan Born e agora reduz a companhia em 50% dos empregados, mantendo a sua operação com uma frota mínima e transferindo o grosso das operações internacionais para a Arrow Cargo, controlada pelo próprio fundo, para a qual também ordenou transferência de ativos aeroportuários da companhia brasileira.

O chinês Lap Wai Chan já teria deixado o país, dizendo que aqui não pisa mais e consumado a sua ordem de demissão em massa. Para que tanta luta, se o bem mais preciso da empresa – os empregados de funcionários brasileiros – foi reduzido a pó? O sorriso de Lap Wai Chan é fruto da burocracia e inércia de um órgão fiscalizador, no caso a Anac – Agência Nacional de Aviação Civil, que ao invés de agir com mão firme, como fez a diretora-presidente ao flagrar um funcionário distribuindo pela internet cópia de um artigo deste jornalista que fazia o retrato fiel dos problemas de gestão do órgão e que foi sumariamente demitido, prefere cruzar os braços e deixar que a empresa aérea continue controlada por estrangeiros.

A justiça paulista merece um capítulo à parte, ao tentar entender a lógica confusa do juiz José Paulo Camargo Magano, que entre colapsos emocionais e estresse declarado, escreve decisões judiciais que precisam ser decifradas. O pior que, ao desprezar ouvir outros colegas, como fez solenemente com o Luiz Roberto Ayoub, da 1ª. Vara Empresarial do Rio e Fórum Universal para os assuntos da Varig em recuperação judicial, Magano construiu um processo cheio de idas e volta. Nomeou Rocha Lima, depois o afastou. Nomeou Lap Wai Chan e depois o afastou. Agora nomeou um argentino sem saber se o mesmo tem permissão para trabalho no Brasil e, o que é mais grave, deixando que o próprio fundo continuasse a manipular a gestão da companhia, contrariando o artigo 181 do Código Aeronáutico.

Não há como separar o fundo Matlin Patterson de Lap Wai Chan. A decisão de demonizar o chinês, aplicando multas e mantendo a gestão do fundo, para que ele possa manipular o novo gestor como marionete, é mais do que clara. Parece uma justificativa para a mídia, que tem colocado uma lupa inesperada na questão da VarigLog. Criou-se uma cortina de fumaça, que esconde uma realidade que continua a mesma. O difícil é que Magano explique aos sindicatos, tanto dos Aeronautas quanto dos Aeroviários, como permitiu uma redução brutal do quadro de 50% dos funcionários, com a demissão de quase mil pessoas, se a empresa possui ativos como os US$ 86 milhões na Suíça e os R$ 140 milhões de ações da Gol.

Depois da demissão em massa, daqui a pouco chegará a notícia de que o dinheiro na Suíça acabou sendo confiscado por outro poder judiciário, no caso a justiça americana, já que a VarigLog, contrariando a sentença do próprio Magano, está trocando os advogados internacionais que defendiam a cargueira dos ataques do fundo, por outros mais amigos, que quebraram as barreiras internacionais.

Lap Wai Chan deve passar então do sorriso às gargalhadas ao ver que a sua idéia sobre os países emergentes é válida, quando ele afirmou que só os espertos sobrevivem nestes mercados, mesmo ao arrepio das leis. Um sorriso que já custou 900 empregos e centenas de franqueados levados à quase falência. Para um País que deixou a Varig ser esquartejada em praça pública, não será novidade se a VarigLog evapore e sobre para os sócios brasileiros, mesmo afastados em primeira estância, todos os processos trabalhistas e tributários.

Cláudio Magnavita é presidente da Associação Brasileira dos Jornalistas de Turismo, membro do Conselho Nacional de Turismo e diretor do Jornal de Turismo