segunda-feira

A notícia pode ser mortal quando verdade e dor não são respeitadas



Há exatamente dez anos, em julho de 1997, o jornalista Alberto Dines publicava no Observatório da Imprensa da Unicamp o seguinte comentário: “Pequenas perversidades pontuais que, se por um lado não conseguem esconder a cartelização comportamental, hoje imperante na mídia brasileira, pelo outro desnorteiam o leitor e deixam-no a sabor das irresponsabilidades como a confusão entre ATA e Iata cometida pela grande maioria dos veículos brasileiros e desvendada por um pequeno jornal: “The Brazilian Post”, em sua edição de 11/7/97.”
Passando uma década, assistimos a repetição e o agravamento do que Dines classificou de “cartelização comportamental imperante na mídia brasileira”. O problema parece só ter se agravado dez anos depois. O que estão fazendo com a TAM é novamente um absurdo. Estão crucificando a maior empresa aérea brasileira, chamando-a praticamente de mentirosa, tentando imputar a responsabilidade total do vôo 3054 ao reverso da turbina que estava desligado e seguia todo o manual de procedimento. Os manuais do fabricante são apresentados, laudos são fornecidos, diretores concedem entrevista, mas nada convence. Parecem que não querem ouvir nada além do que uma confissão de culpa. Parecem querer provar que a empresa agia de forma irresponsável, colocando 187 pessoas para voar em uma aeronave que não tinha condições. O pior é que este episódio tem como foco a mesma emissora, a Rede Globo, que há exatamente dez anos abriu espaço para levar ao ar no “Fantástico” uma entrevista do advogado aposentado David Stemper, apresentado como presidente da pomposa ATA (Air Traveller Association), que considerou a TAM a empresa mais insegura do mundo. De carona na Globo, todos os grandes jornais seguiram a pista e o assunto virou manchete. Como cita Alberto Dines, coube ao “The Brazilian Post”, sob o nosso comando, investigar e descobrir que a tal ATA tinha 11 dias de fundada, não possuía nenhum sócio, pertencia a um advogado aposentado da área de seguros e funcionava em uma saleta, num andar com 50 outras micro-empresas em Washington. Uma grande armação. O texto do Post foi republicado simultaneamente nos maiores jornais brasileiros. Hoje, assistimos ao mesmo filme. Querem colocar o carimbo de culpado em uma companhia que está agindo com correção desde do primeiro momento do acidente. Toda a comunicação com a imprensa foi impecável, minuto a minuto. Transparência absoluta. A falha em Porto Alegre no atendimento aos parentes foi conseqüência da quebra de um elo da corrente de comando, já que o Marco Antônio Silva, gerente geral da base estava a bordo do fatídico vôo. O que está sob ameaça não é apenas a imagem da TAM, mas de todo a aviação comercial brasileira. Por onde anda o Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea) que ainda não saiu em defesa da sua principal afiliada? Por que deixam a TAM sozinha nesta cruzada?As conseqüências deste tipo de especulação televisiva só joga mais combustível nas chamas que consumiram tantas vidas e que fizeram o País chorar. Especular antes das investigações e tentar perigosamente imputar responsabilidades antecipadas. É acirrar os ânimos e dar desconforto espiritual à famílias que precisam de paz. A angústia é aumentada por causa de um sensacionalismo que não faz parte dos manuais de redação dos veículos mais nobres da família Marinho. Se for provado que a ausência do reverso da turbina causou o acidente, a responsabilidade é do fabricante, que por escrito orienta os operadores a voar por dez dias com a aeronave neste estado. A TAM seguiu o que estava escrito e só. O avião, como a frota das maiores companhias brasileiras, seguem um rígido padrão de manutenção auditado internacionalmente, inclusive a própria TAM recebeu uma certificação internacional pela sua excelência em manutenção. Desconhecer isso é querer fazer jornalismo barato em horário nobre, aumentando a dor de familiares por dizer na entrelinha que o luto poderia ter sido evitado.O resultado disso pode ser medido pela hostilidade que a diretoria passou a ter por parte dos parentes e até a devolução de coroas de flores enviadas com sincero pesar.Dois dias depois do acidente em Congonhas, um Fokker 100 da mesma empresa fez uma correção da aproximação e pousou minutos depois no mesmo aeroporto. A repórter da GloboNews deu a noticia de forma sensacionalista, apavorando o País e dizendo que o avião seguiu para pouso em Guarulhos. O que não foi verdade. A notícia foi repetida exaustivamente toda uma manhã e migrou para a emissora principal.Assistir passivamente uma empresa e seus acionistas, que responde por mais de nove mil empregos diretos e que é a principal transportadora brasileira, que tem como missão transportar milhares de brasileiros com segurança, ser imputada antecipadamente como responsável por um acidente que os deixou também profundamente enlutados pela dor da perda de vidas, da imagem e de um trabalho ético e responsável é pactuar com a mesma reedição do absurdo que há dez anos teve o mesmo teor destrutivo por parte do mesmo veículo. Muito mais do que uma fria companhia, a TAM é uma empresa gerida por pessoas, que sentem, sofrem e se desdobram em um momento critico como este. E sabem bem, na própria carne, o que é perder um ente querido em um desastre aéreo. Foi assim que perderam o seu fundador, o inesquecível comandante Rolim Adolfo Amaro, ceifado estupidamente num momento que ainda poderia contribuir muito pelo País. E foi a família Amaro que assinou as notas oficias à sociedade, exatamente por saberem no coração, o tamanho que esta dor representa. Cláudio Magnavita é presidente Nacional da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo, membro do Conselho Nacional de Turismo e diretor do "Jornal de Turismo".