terça-feira

Na aviação, o ministro acaba tendo um perfil muito parecido com o de Denise Abreu

O ministro da Defesa Nelson Jobim acabou fazendo a mea culpa em uma reunião de ministros quando afirmou: "Fui autoritário, tive que ser autoritário, e tive que fingir autoritarismo". Depois explicou que precisou agir dessa forma porque era preciso passar a idéia de que não existia mais falta de comando no setor aéreo brasileiro.
Jobim vem demonstrando que tem perdido o tom. Exagerando nos embates públicos e se desgastando com os factóides que tem criado, até mesmo ignorando o seu passado como ser político. Deputado federal de dois mandatos pelo Rio Grande do Sul, ele foi ministro da Justiça por dois anos do Governo Fernando Henrique até ser indicado pelo Planalto para uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Durante sua vida parlamentar foi militante ativo do PMDB, legenda pela qual espera concorrer à próxima sucessão presidencial. Foi do próprio partido que partiu a primeira reação pública que se mobilizou para defender o ex-deputado Leur Lomanto, que ficou na linha de tiro de Jobim.
Filho do ex-governador e ex-senador da Bahia Lomanto Junior, Leur Lomanto foi deputado federal por duas décadas (foi colega do próprio Nelson Jobim) e na Câmara foi o relator do projeto de lei que criou a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A sua ida para a agência decorreu desse trabalho, que o fez debruçar em seminários, audiências públicas e a conhecer profundamente este assunto.
O que tem revoltado os correligionários peemedebistas de Lomanto é a forma truculenta que o ministro vem tratando os diretores da Anac, todos com currículos e especializações, como é o caso de Josef Barat, ex-secretário de Transportes do Rio, especialista em logística e com formação na área acadêmica. O mesmo ocorria com o coronel aviador Jorge Velozo, que tem a sua base na aeronáutica e com Milton Zuanazzi, especialista no setor de turismo, uma área que responde por 86% das vendas das companhias aéreas. Um mix de experiências, no qual soma-se experiências legislativas, acadêmicas, operacionais e de mercado. Quem destoou sempre deste colegiado foi Denise Abreu, que deveria trazer uma bagagem jurídica e de regulamentação, mas sempre prevaleceu o seu gênio forte e uma rispidez que lhe trouxe os primeiros desgastes públicos. A sua renúncia da diretoria da Anac deveria ter sido suficiente para equilibrar o fatos, mas não foi isso que ocorreu por culpa da determinação do ministro da Defesa em implodir a agência ou de subordiná-la de forma servil à sua pasta.
O pior é que se estabelece às claras um perigoso quadro de embate entre o Executivo e uma agência reguladora, que é um órgão de Estado, que tem a sua missão subvertida quando é colocada como subserviente ao setor que deveria fiscalizar.
O que está em jogo é muito grave. Neste caso é só focar na essência do que está ocorrendo. Um ministro de Estado resolve publicamente questionar até mesmo a existência ou não de uma agência reguladora e aproveitando a carona da imagem desgastada da Anac para pressionar a saída dos diretores mandatários. Abre-se um perigoso precedente, principalmente quando será o próprio ministro da Defesa que indicará os nomes que substituirá os diretores que não resistirem à pressão.
É só questionar e refletir sobre o que está ocorrendo. Os novos nomes que embarcarão na Anac não serão escolhidos por um ser político? Será que Jobim está rasgando o seu passado partidário e o seu sonho de concorrer à sucessão presidencial? Se a indicação não será feita pela sociedade civil e nem em audiência pública, continuará ou não uma das principais queixas que hoje atingem a Anac, o de ser gerida por indicações políticas? A diferença é que os nomes serão indicados por um único político que terá a chance de colocar uma mordaça de ferro na agência que deveria fiscalizar o setor que está sob a sua responsabilidade.
A Agência Nacional de Aviação Civil, que tem menos de um ano e meio de existência, está sendo responsabilizada por um problema encastelado há pelo menos uma década e meia no país. A Anac é a sucessora do Departamento de Aviação Civil (DAC) e herdou não só os quadros funcionais como também todo o cenário que o próprio DAC deixou. Quando o próprio ministro da Defesa afirma no Plenário da CPI do Apagão Aéreo na Câmara que a agência não deveria ter permitido o crescimento do fluxo em Congonhas, não existe um único assessor capaz de informá-lo que este quadro foi responsabilidade dos militares do Departamento de Aviação Civil e não da Anac, que desde a sua existência só reduziu as operações em Congonhas.
Durante seis horas de depoimento na mesma comissão, o ministro Nelson Jobim foi autor de uma avalanche de comentários primários e leigos assustadores. Entre eles, defendeu a diminuição da oferta e não demonstrou preocupação com a elevação dos custos e o repasse desses valores para o valor dos bilhetes pagos pelos passageiros.
Estas exposições à base de factóides e desprovida de sustentação técnica já começam a perder gás. O voto de confiança que é dado para aqueles que chegam ao cargo público está se esgotando no caso de Jobim, pela surpresa de encontrar uma personalidade truculenta, sem impor limites na sua sensação de poder. O irônico é que, num plano maior, Jobim está cometendo os mesmos pecados que vitimou Denise Abreu. Coincidentemente os dois têm a mesma origem profissional: o mundo jurídico. E os dois exageraram nas suas ações no exercício do poder com soberba, causando terremotos. Esses abalos sísmicos causaram a própria tsunami que afogou Denise e no caso de Jobim o epicentro do primeiro tremor foi no próprio PMDB, que está profundamento desagradado com o estilo caudilho do seu correligionário.
Cláudio Magnavita é presidente da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo, membro do Conselho Nacional de Turismo e Diretor do Jornal de Turismo